quarta-feira, setembro 06, 2006


Difícil escrever. Difícil sentir que corre em nossas veias este vermezinho tão lindo que é a Literatura. Os vermes nos devoram. A literatura também é assim, mas este assassínio lento de colocar no papel e criar outros mundos, outros seres, dá o prazer da dor!
Escrever é se envenenar e amar o veneno, senti-lo navegar em todo corpo e urrar na dor mais sublime e romanesca dos tempos.
Num país tão caótico onde vendemos literatura de garotas de programa, de livros de auto- ajuda que só servem para incitar o suicídio, que a dramaturgia vendável beira a banalização total do ser humano; podemos dizer que nós somos guerreiros de palavras construtivas, edificantes, pensantes...
Nestas horas penso em Clarice, a Lispector; penso em Érico Veríssimo, em Machado de Assis, em Graciliano Ramos, em Joracy Camargo, em Nélson Rodrigues...Penso neles porque viveram num tempo mais brando em termos de valorização do que é a verdadeira literatura.
Bem, sem tomar o tempo de vocês, até porque estou muito ansioso para que me conheçam melhor! Vou deixar para a minha estréia no blog, uma poesia que fala um pouco da angústia dos artistas.
Quem ainda acredita em arte, vai se reconhecer!


Angústia do Mundo

Eu tenho a angústia do mundo,Este pesadelo eu tenho.
O Pesadelo do artista, do corrompido, dos ratos que espreitam o queijo...
Mares de água, Mortes de sangue, águas mortes, mares de sangue !
Tenho a indecisão dos amantes, a sofreguidão das mães abandonadas...
Tenho o nada e o tudo, a fé e a descrença.
Tenho presença de tudo que fui ou serei um dia
Ou do que nem sei que sou.
Amor, Dor, Ritos, Gritos, Sinos e SendasFlor, Vendas, Filhos, Livros e Cor
Eu tenho a angústia do Mundo, eu Tenho a Guerra em mim
Espadas, Adagas, Saara sem fim!
O lenço branco do vento, o sol vermelho do fim...
Trago a fúria do tempo, o beijo amargo carmim da prostituta!
A Luta, o luto, a letra que borda lençois de cetim.
Eu tenho a angústia do mundo, o desabafo do fadista, indecisão dos amantes, o nada e o tudo !Tenho a mim, a cabeça em rodas, embriagada de sim...
Tenho rimas pobres e vulgares deste poema, trago a ânsia desta obra sem fim.
Que nunca se faz, colcha que nunca acontece.
Eu tenho as idéias inúteis que se perdem como agora
O que fazer, a quem amar ?
Eu tenho a angústia do mundo, eu tenho a guerra em mim.
Eu tenho a Guerra em mim, a angústia do mudo.
Um sonho sem fim.
(Charlie Rayne)
----------------Filhas--------------------
Para quem não sabe ainda, eu sou dramaturgo. Deixei minhas filhas no Rio de Janeiro. Uma delas, "A Trama" está em temporada em Setembro na Casa de Cultura Elbe de Holanda. Outra delas, "Izabel, seus Buquês e seus Vestidos" está em processo de montagem, e a outra, "Memorial de Amor Inquieto" está abandonada por enquanto. Rezo para que elas dêem orgulho ao pai e que os padrinhos cuidem muito bem delas.
Mas que dá uma tristeza abandonar os filhos, isso dá!
-------------------------------Pelotas/Rio/Gaúchos/ Cariocas----------------------------------
Morei três anos no Rio de Janeiro. Sou de Pelotas, Rio Grande do Sul. Tenho 30 anos feitos. Fumo, bebo e escrevo. Querem vícios piores que esses?
Pois então, eu falava que sou de Pelotas...Sim. Sou de Pelotas e não minto que sou de Porto Alegre(recadinho para alguns artistas do Rio que escondem a sua pelotinidade- criei neologismo!). Mentira. Algumas vezes eu falei que era de Rio Grande, só para não ter de ouvir certas piadinhas.
Bem, como eu ia falando, sou de Pelotas e voltei faz duas ou três semanas. Que orgulho ver minha cidade tão linda, com seus prédios imponentes, seu povo bonito, sua fala forte, seu teatro vigoroso ainda...Já falei que Pelotas tem o mais antigo grupo de Teatro do Brasil? Sim. Teatro Escola de Pelotas. Ali eu aprendi a ser ator, dramaturgo, pessoa, essas coisas que não tem valor material, mas que são essenciais para a construção do profissional e do ser humano.
Retomando o assunto, morei três anos no Rio de Janeiro...Morei lá e aprendi a lição mais importante na minha carreira: toma cuidado com carioca! Eles vêm com fala toda cheia de xis, te convidam para tomar uma cerveja e daí todos devem saber...
Deixei poucos amigos lá e os poucos que deixei me bastam. Amizade é coisa séria! E não é que no Rio de Janeiro encontrei pelotenses que foram piores que os cariocas? Faltava a chiadeira, mas o "bah, tchê" também foi fatal.
Ok. To em Pelotas. Saí do Rio. Vou para outro lugar deste país ano que vem. Vou voltar para o Rio um dia.
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-----------------------------------A Porta-------------------------------------------
Podem bater à minha porta a hora que for. Gosto de surpresas que vem das portas. A porta é o trivial de toda notícia, de toda aparição...As coisas simples e triviais são as mais belas.
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Devaneios e Realidade
Gosto de brincar que sou um dramaturgo bem conhecido, renomado mesmo. Por exemplo, agora imagino que todos, com exceção dos amigos, todos vasculham minhas palavras, todos alucinadamente tentam interpretar as coisas que escrevo e criam milhões de interpretações para elas.
Gosto de imaginar que vivo muitíssimo bem da minha arte. Que neste exato momento, enquanto escrevo este texto, uma quantia razoável de dinheiro está sendo depositado na minha conta! Estou a gargalhar agora. Alguém que não consigo enxergar direito, pois estou absorto na minha escrita, alguém me alcança uma xícara generosa de café e alguns petiscos...Eu recuso.
Outra gargalhada.
Estou num escritório particular, na minha própria casa. De minha janela posso avistar um jardim bem cuidado, esmerado mesmo. Muitas flores. Não fumo. Não bebo nesta cena. Sou um respeitável Senhor de seus setenta anos e setecentos livros...Outra gargalhada! Meu teclado é feito de marfim...marfim mesmo!
À noite vou receber alguns amigos. Escritores, atores, diretores de cinema e teatro. Vou falar o estritamente necessário e vou partir para a cama antes que eles terminem seus discursos enfadonhos...
Outra gargalhada. Acordo. Estou de pijama. Um pijama ridiculamente amarfanhado. Meus cabelos estão em pé. Nem lavei o rosto ainda. Meu teclado está sujo de cinzas de cigarro e um café insuportavelmente malfeito desfila em minhas papilas gustativas...Ah, não tenho setenta anos, tenho trinta. Da minha janela avisto uma outra janela: a janela de uma vizinha gorducha cuja principal missão na vida parece ser a limpeza das janelas. Tenho um cachorro que acabou de urinar no tapete. Hoje mesmo vou tentar vender algum livro usado para poder comprar o cigarro de amanhã. Outra gargalhada! Uma tosse! Escuto a voz da minha mãe:
- guri, sai deste computador! Já sei. Está escrevendo aquelas porcarias que não te levam a nada!
Outra tosse. Outra e outra. Derramei o café no teclado.
- Olha só! Derramaste café no teclado! E as cinzas de cigarro? Não acredito! O cachorro urinou novamente no chão! Pega o pano e limpa! O cachorro é teu!
Vou acabar esta droga de texto, enfiar uma colher generosa de mel com propólis na boca e gargalhar nos meus sonhos!
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Se alguém quiser se comunicar comigo e partilhar deste dilema que novos escritores e dramaturgos passam, podem mandar e-mail para: charlie.rayne@gmail.com

1 Comments:

Anonymous Sabrina said...

De: Sabrina
Soor vim aqui te dar os parabéns pelos teus textos,muito bons queria eu ter a habilidade e a criatividade de escrever coisas tão bunitas quanto as que você escreve...
Parabéns mais uma vez...

20 maio, 2010  

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