sábado, novembro 08, 2008


Depois de mais um longo período em que me detive a esquecer a tarefa de postar, volto. Volto para dizer que minha vida de escritor está encerrada, posto que a vida está escrevendo por mim. Dá um cansaço escrever quando a escrita da vida está numa velocidade torturante! Muita, muita adrenalina!
De posse desta realidade, tirei do baú um texto que fala sobre escolha profissional e ofereço aos meus alunos do Curso de Aprendizagem Comercial do Senac Pelotas.



A Decisão de Claudinho...
Mulher fazendo tricô incessantemente. Está nervosa. A atividade é como um subterfúgio para tentar acalmar-se diante da situação que está para acontecer.

Néstor: Ele já se decidiu?

Mulher: Já. Ele quer falar com você...

Néstor: Porque você está com essa cara?

Mulher: Que cara?

Néstor: Essa cara estranha!

Mulher: Nada.(fica nervosa e deixa cair o tricô no chão)

Néstor: Ele já contou para você não contou?

Mulher: O quê?(pega o tricô que caiu e torna a tricotar mais nervosa ainda. As mãos tremulam)

Néstor: O que ele decidiu?

Mulher: Decidiu o quê? Ah, ele quer um blusão verde com bolinhas amarelas.

Néstor: Eu estou perguntando se você sabe o que ele decidiu. Aquela outra coisa, não o tricô!

Claudinho entra de cabeça baixa, preocupado.

Claudinho: Pai... Eu decidi!

Mulher: Filho, vai com calma. Seu pai quando fica nervoso tem crises de hemorróidas...

Néstor: Vamos. O que você decidiu?

Claudinho: Eu decidi. Pensei muito e decidi.

Mulher: Claudinho, por favor. Pega leve!

Néstor: Fala Claudinho. Estou pronto. O que você decidiu?

Claudinho: Medicina pai. Eu quero prestar vestibular para Medicina!

Néstor: O quê?

Claudinho: É isso mesmo! Eu quero ser médico! Cirurgião Plástico!

Mulher: Acalma Néstor. Acalma!

Néstor: Foi para isso que eu te criei? Para ser um médico? Que vergonha! Que vergonha! Um médico! Onde foi que eu errei Claudinho? Onde foi?

Claudinho: Eu não queria decepcionar o senhor, mas é mais forte que eu.

Néstor: Eu lembro bem. Você era pequeno e já inventava aquelas brincadeiras de médico com as vizinhas da rua. Eu falei pra sua mãe, que isto era uma tendência perigosa. Eu falei.(para a mulher) E você me disse que era coisa de criança. Pois sim!

Mulher: Paizinho! Deixa o menino decidir o que é melhor para ele!

Claudinho: Perdoa pai! Me perdoa (ajoelha-se aos pés do pai)

Mulher: Ele não quer fazer Dança. Ele não quer Néstor!

Néstor: Filho ingrato! Sai da minha frente. Eu não te perdôo!

Néstor: Pensei que o meu filho seria um bailarino clássico, a fazer “plies”, “grand plies”, “arabesques”... Sempre sonhei em ver você, de sapatilha de ponta, usando um colant azul bebê... E aí está um marginal que quer fazer medicina. Isto são as companhias! Aquele bando de amiguinhos que você tem. Todos médicos, veja só, que vergonha para os pais! (começa a tremer, sente-se mal, fica tonto)

Mulher: Néstor! Néstor!

Claudinho(segurando o pai): Pai, não faz assim. Pai! Pai!

Mulher: Ele desmaiou de vergonha! Ele pode até morrer! Viu o quê você fez? Você matou seu pai Claudinho! Custava fazer a vontade dele? Custava decidir uma profissão estável e lucrativa como a dança?

Claudinho: Se eu já tivesse passado no vestibular e terminado a faculdade, agora mesmo poderia cuidar do pai. Ele precisa de um médico!

Mulher: Seu pai é direito, honesto! Jamais vai ser tocado por um médico! Ele prefere morrer a ter um filho médico!

Claudinho:Você também está contra mim agora?

Mulher: Estou do lado que é direito, honesto. Se você fizer Medicina pode pegar suas coisas e esquecer que um dia teve um pai e uma mãe! Nestor, paizinho, levanta.(Nestor acorda e levanta) Vamos deitar. Eu vou dar calmantes para você.

Claudinho: Pai? Olha para mim!

Pai: Você me matou! Eu morri para você e você morreu para mim. Só torne a falar comigo quando decidir dançar “Paquita” ou “Lago dos Cisnes” no palco do municipal!